13 outubro 2006

Fwd: Chico Buarque e a política

Chico Buarque também se posiciona sobre eleição presidencial.

Chico Buarque: lucidez e coerência
A cada uma de suas entrevistas, o compositor e cantor Chico Buarque de Holanda sempre surpreende por sua lucidez e enorme coerência. Agora, no lançamento do seu novo CD, Carioca, ele novamente brilhou ao falar sobre a situação política brasileira. A direita deve ter ficado furiosa, com saudades dos tempos da ditadura militar que o perseguiu e censurou; a esquerda "rancorosa" deve ter ficado ressentida com seus irônicos comentários; já os setores da sociedade que, mesmo críticos das limitações do governo Lula, não perderam a perspectiva, ganharam novo impulso criativo para a sua atuação. Mas é melhor deixar o poeta falar, pinçando trechos das suas entrevistas na revista Carta Capital e no jornal Folha de S.Paulo:

Sobre a crise política:

É claro que esse escândalo abalou o governo, abalou quem votou no Lula, abalou sobretudo o PT. Para o partido, esse escândalo é desastroso. O outro lado da moeda é que disso tudo pode surgir um partido mais correto, menos arrogante. No fundo, sempre existiu no PT a idéia de que você ou é petista ou é um calhorda. Um pouco como o PSDB acha que você ou é tucano ou é burro (risos).

Agora, a crítica que se faz ao PT erra a mão. Não só ao PT, mas principalmente ao Lula. Quando a oposição vem dizer que se trata do governo mais corrupto da história do Brasil é preciso dizer 'espera aí'. Quando aquele senador tucano canastrão diz que vai bater no Lula, dar porrada, quando chamam o Lula de vagabundo, de ignorante - aí estão errando muito a mão. Governo mais corrupto da história? Onde está o corruptômetro? É preciso investigar as coisas, sim. Tem que punir, sim. Mas vamos entender melhor as coisas. A gente sabe que a corrupção no Brasil está em toda parte. E vem agora esse pessoal do PFL, justamente ele, fazer cara de ofendido, de indignado. Não vão me comover...

Preconceito de classe.

O preconceito de classe contra o Lula continua existindo - e em graus até mais elevados. A maneira como ele é insultado eu nunca vi igual. Acaba inclusive sendo contraproducente para quem agride, porque o sujeito mais humilde ouve e pensa: 'Que história é essa de burro!? De ignorante!? De imbecil!?'. Não me lembro de ninguém falar coisas assim antes, nem com o Collor. Vagabundo! Ladrão! Assassino! - até assassino eu já ouvi. Fizeram o diabo para impedir que o Lula fosse presidente. Inventaram plebiscito, mudaram a duração do mandato, criaram a reeleição. Finalmente, como se fosse uma concessão, deixaram Lula assumir. 'Agora sai já daí, vagabundo!'. É como se estivessem despachando um empregado a quem se permitiu o luxo de ocupar a Casa Grande. 'Agora volta pra senzala!'. Eu não gostaria que fosse assim.

Eu voto no Lula!

A economia não vai mudar se o presidente for um tucano. A coisa está tão atada que honestamente não vejo muita diferença entre um próximo governo Lula e um governo da oposição. Mas o país deu um passo importante elegendo Lula. Considero deseducativo o discurso em voga: 'Tão cedo esses caras não voltam, eles não sabem fazer, não são preparados, não são poliglotas'. Acho tudo isso muito grave. Hoje eu voto no Lula. Vou votar no Alckmin? Não vou. Acredito que, apesar de a economia estar atada como está, ainda há uma margem para investir no social que o Lula tem mais condições de atender. Vai ficar devendo, claro. Já está devendo. Precisa ser cobrado. Ele dizia isso: 'Quero ser cobrado, vocês precisam me cobrar, não quero ficar lá cercado de puxa-sacos'. Ouvi isso dele na última vez que o vi, antes dele tomar posse, num encontro aqui no Rio.

Sobre o PSOL.

Percebo nesses grupos um rancor que é próprio dos ex: ex-petista, ex-comunista, ex-tudo. Não gosto disso, dessa gente que está muito próxima do fanatismo, que parece pertencer a uma tribo e que quando rompe sai cuspindo fogo. Eleitoralmente, se eles crescerem, vão crescer para cima do PT e eventualmente ajudar o adversário do Lula.

Papel da mídia.
 
Não acho que a mídia tenha inventado a crise. Mas a mídia ecoa muito mais o mensalão do que fazia com aquelas histórias do Fernando Henrique, a compra de votos, as privatizações. O Fernando Henrique sempre teve uma defesa sólida na mídia, colunistas chapa branca dispostos a defendê-lo a todo custo. O Lula não tem. Pelo contrário, é concurso de porrada para ver quem bate mais.

MANIFESTO
 
Sobretudo, não votar em Alckmin
Diante da proximidade do final do primeiro turno das eleições presidenciais, faz-se necessário vir a público a fim de dizer que não há razão alguma para votar no candidato do PSDB, Geraldo Alckmin. Fatos recentes relativos a dossiês e novos personagens envolvidos com o escândalo das sanguessugas aumentaram a temperatura da, até então, mais "morna das eleições" entre tantas ocorridas desde a redemocratização. Editoriais, diretores de redação de jornais e revistas, articulistas que se apresentam como "formadores de opinião pública", todos comprometidos com o chamado "jornalismo investigativo e independente", têm vindo a público defender o voto em Alckmin para que o mesmo seja içado ao segundo turno. No entanto, vale a pena lembrar que a forma mais cínica de totalitarismo é a moralidade seletiva. Desde a eclosão do escândalo dos sanguessugas pairam enormes dúvidas sobre a conivência ou não dos ex ministros da saúde com o esquema de superfaturamento das ambulâncias. Nesse caso, o tucano José Serra aparece com indícios fortes de implicação direta ou, no mínimo, conivência. Mais de 70% das ambulâncias superfaturadas foram liberadas em sua gestão no Ministério, várias para o Estado de São Paulo, do então governador Geraldo Alckmin. Estranho, para não dizer surpreendente, que o "jornalismo investigativo e independente" de nosso país, não tenha se atentado para essas questões na última semana. Será que estão satisfeitos com a nota publicada por Serra nos jornais se inocentando e dizendo que nada sabia? Por que para o "jornalismo independente e investigativo" o peso do "nada sabia" de Serra vale como declaração de idoneidade? Esta "dupla medida" em relação à corrupção tucana indica o que acontecerá em um provável governo Alckmin. Pois, a respeito de Alckmin, não seria difícil lembrar aqui que, durante toda a campanha, o candidato tucano contentou-se em remixar um discurso arcaico de direita, com direito a bravata contra impostos, "gastança" pública, promessa de redução do Estado, de reformismo infinito da previdência e laivos de indignação contra a corrupção (na qual seu próprio partido está organicamente envolvido). Ou seja, nada mais do que um candidato de direita em qualquer parte do mundo faria desde o início do século XX. Acrescenta-se a isto uma simpatia temerária por entidades proto-fascistas como a Opus Dei. Mas vale a pena tecer algumas considerações demoradas sobre os seus dois maiores pilares: ética e competência. Podemos claramente imaginar o que acontecerá se Geraldo Alckmin ganhar a eleição. Ele irá impor uma lógica de abafamento e impedimento de CPIs que funcionou maravilhosamente bem na Assembléia Estadual de SP. Uma lógica a respeito da qual seu partido é especialista, já que os oito anos FHC foram marcados pela impossibilidade de investigar a fundo todos os escândalos que marcaram o governo. Quem não se lembra da presteza do chamado "engavetador-geral da República", Geraldo Brindeiro? Alckmin aprendeu muito bem esta lógica, tanto que nada foi investigado a respeito das suspeitas de compra de deputados estaduais via Nossa Caixa, das suspeitas de corrupção em órgão públicos como a CDHU, o Rodoanel, as privatizações de São Paulo, as doações de vestidos à sua mulher, a subvenção à revista de seu acumputurista, entre outros tantos. São mais de 60 CPIs arquivadas. Número difícilmente superável. O Brasil quer voltar a esta época da corrupção silenciosa e "profissional"? Basta ver que sempre quando um tucano está em linha de mira, quando um mensaleiro tucano é descoberto (Azeredo), quando uma ligação com os sanguessugas é desvendada (Serra, Antero Paes de Barros), quando esquemas de financiamento ilegal são apontados (Furnas), as investigações param, tomam outro rumo e a imprensa perde gradativamente o interesse. Ou seja, nenhuma indignação ética pode justificar um voto em Geraldo Alckmin e seu partido. Alckmin é aquele que, diante do fato de até mesmo FHC reconhecer que seu partido não teve a mínima dignidade ética ao fazer tudo para livrar a cara de Eduardo Azeredo, respondeu nada querer falar sobre o assunto. É com este silêncio que ele tratará todos os escândalos que envolveram seu partido nos últimos dez anos. Por outro lado, sua alegada competência não resiste a uma análise isenta. Sua política desastrada de segurança pública alimentou a criação do PCC. Ao ver o resultado desastroso de sua política de segurança, baseada apenas na truculência, no Encarceramento e no extermínio, Alckmin foi sequer capaz de uma mínima auto-crítica: "Se houvesse algum problema, eu já teria identificado", foi o que ele disse a este respeito. Retrato clássico da arrogância de quem não consegue aprender com os próprios erros. Ao contrário, ele preferiu transferir responsabilidades dizendo que o culpado era o governo federal, chegando a insinuar que algo como o PCC só poderia existir devido a algum conluio eleitoral, como se ele nada tivesse a ver com o problema. Isto a ponto de um jornalista ter-lhe dito: "Então tudo deu errado porque o senhor fez tudo certo?". Como se não bastasse, este "tocador de obras" conseguiu atrasar as datas de entrega de todas suas grandes obras. Sua política de educação colocou as universidades estaduais à míngua, algumas não têm sequer condição de pagar contas correntes. Seu secretário de Educação (Chalita) chegou mesmo a maquiar números a fim de tentar esconder os resultados calamitosos de sua política. Não é por outra razão que, mesmo em seu Estado, Alckmin passou toda a campanha política em segundo lugar. Quem conhece Alckmin não parece disposto a votar em Alckmin. As razões acima e as dúvidas não respondidas nem pelos candidatos nem pelo "jornalismo investigativo e independente" dão a certeza de que o voto em Alckmin, de modo algum, representa o resgate da moralidade pública e, muito menos, o avanço das instituições democráticas republicanas. Ao contrário, ele representa a volta da corrupção silenciosa, da complacência da mídia, da criminalização dos movimentos sociais e da agenda direitista mais pura e dura. Por isto, vários movimentos sociais, como o MST, a UNE e a CUT, dizem: sobretudo, não votar em Alckmin.


 

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