25 outubro 2006

A violência condecorada - Laerte Braga

SERES OU RESES

25.10.2006
A violência condecorada
Um jovem de 19 anos de idade foi assassinado por um pistoleiro fardado e com divisas de sargento, da Polícia Militar de São Paulo. O jovem recebeu ordens de colocar as mãos à cabeça, não reagiu, cumpriu a determinação do assassino e em seguida recebeu um tiro de metralhadora no peito.
Para os PMs que participaram da "operação", uma fatalidade, já que um barulho de escapamento de moto sugeriu um tiro. Para o dono da borracharia onde o jovem estava, uma violência.
Uma hora depois do crime os mesmos PMs voltaram ao local e fizeram nove disparos para intimidar testemunhas. Desceram da viatura e recolheram as cápsulas para evitar identificação pela perícia.
Daniel Felipe Dornelas, a vítima, não tinha antecedentes criminais e era pai de um filho, um menino de trinta dias.
Deve ser isso que Alckmin chama de segurança pública.
Um motoqueiro igualmente sem antecedentes criminais foi morto na semana passada num shopping em Campinas, uma das cidades mais violentas do País. Havia derrubado uns cones desses que se colocam para orientar o trânsito. Um segurança do shopping não gostou, interpelou o jovem e o rapaz respondeu: "o que eu fiz?" Recebeu tiros e morreu.
O shopping é propriedade de Carlos Jereissati, irmão de Tasso Jereissati e um dos sócios da TELEMAR.
O senador, presidente nacional do PSDB, é sócio nos negócios do irmão, embora se digam brigados. Não é impedimento. Os tais "negócios" foram herdados do pai e a TELEMAR acrescida ao patrimônio na corrupção que permeou o processo de venda do setor de telefonia durante o governo FHC.
Seguranças matam no País inteiro. Os caras acham-se donos do mundo.
PMs matam no Brasil de norte a sul. São instrumentos das grandes corporações, do sistema financeiro e do latifúndio.
A impunidade é a regra que dá a esse tipo de bandido fardado ou vestido de autoridade H2O, o direito de fazer o que bem entende.
Refletem a mentalidade das elites, são guardiões da propriedade privada e dos vestidos de dona Lu.
É preciso uma corporação que faça a classe trabalhadora, os excluídos, entenderem o seu "verdadeiro lugar".
Não podem incomodar os donos e nem prejudicar os "negócios".
As polícias militares cumprem esse papel.
E, no caso do jovem Felipe, de vez em quando quase sempre, permitir que a boçalidade dos integrantes dessas corporações se manifeste.
Deve ser isso que Alckmin entende por segurança.
No Rio de Janeiro uma senhora é condecorada pela Câmara Municipal por ter reagido a um assalto e conseguido deter o assaltante. Até aí nada demais.
Demais foi a declaração da dita cuja. "Os mendigos deveriam ser todos jogados no rio".
Os que morrem nas ruas são trabalhadores. A elite é guardada por câmeras, cães ferozes, seguranças e policiais militares.
Em São Paulo, então, corra dos tucanos. No Rio, corra das que tomam banho de água benta, bochecham e gargarejam com água benta e querem jogar os mendigos no rio. Um outro rio.
Lacerda fez isso em tempos idos. No rio da Guarda. A turma da sua polícia prendia os infelizes e os jogava no tal rio. Pela idade da senhora em questão, deve ser sobrevivente dessa época.
Antônio Maria chamava essa turma de malamadas.
Por essas e outras, com certeza, Chico Buarque proclamou que, em caso de necessidade, "chame o ladrão".

Laerte Braga é jornalista. Nascido em Juiz de Fora, trabalhou no Estado de Minas e no Diário Mercantil.

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