20 janeiro 2008

SOMOS O PRÓPRIO PROFETA - Artur da Távola

SOMOS O PRÓPRIO PROFETA
Artur da Távola

Em relação a qualquer sentimento ou fato marcante da própria vida, a gente sempre como que "soube" o que aconteceria. É uma vivência difícil de expressar verbalmente, essa de já termos guardados, numa espécie de pré-lembrança (recordação do que ainda vai acontecer), os elementos básicos de acontecimentos e sentimentos futuros. Quando tais ocorrências aparecem, elas misturam o espanto da novidade com uma espécie de confirmação. Nossa mente inconsciente parece ser uma constante enviadora de sondas que atingem locais muito além dos alcançados pela mente consciente. As sondas detectam, no longe, vivências, sensações, sentimentos, adivinhações (pré-lembranças) que entram num computador secreto (fora do alcance da memória consciente) e lá ficam arquivadas. No momento em que ocorre a vivência já antes percebida pela sonda, mesmo tomados pela surpresa do inédito, algo familiar mora no acontecimento, algo já sabido, percebido, intuído leve ou profundamente. Somos o próprio profeta falando um idioma ininteligível para o momento que passa. Vamos adiante e além, numa esfera do sem tempo. O nosso consciente é temporal. O nosso inconsciente é a-temporal. É atemporal. Passado e futuro jazem nele, porque passado e futuro compõem a inteligência (substância) de cada célula de que somos constituídos. A gente não conhece o que acontecerá, mas sempre soube o que aconteceria. Saber é diferente de conhecer. Saber que é sabor (as duas palavras têm o mesmo significado etimológico), sente o gosto, entra em relação sensorial com a coisa, significa experimentar. Conhecer é um ato de razão. Saber é muito mais. Tem a razão para identificar, mas tem os sentidos para acrescentar impressões, sensações, antecipações, gostos, etc... Por isso não é possível conhecer o futuro. E por isso é possível saber-se o que aconteceria, vale dizer, o que está na faixa de alcance do nosso inconsciente em relação à própria vida, aos próprios sentimentos. E se a gente sempre soube o que aconteceria, nunca deve duvidar daquilo que adivinha.

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